domingo, 22 de julho de 2012

Homossexualidade não é pecado

Muito se propaga que a homossexualidade não está nos planos de Deus para a humanidade, pelo simples fato de Ele ter criado pessoas de sexo masculino e feminino, pelo que se deduz que foram criados para se complementarem, pela anatomia dos corpos. Sendo assim, a solução para aqueles que não nasceram heterossexuais não viverem em pecado seria a castidade.
Mas se não está nos planos de Deus, porque então Ele criou pessoas homossexuais? A sexualidade é de fundamental importância para todas as pessoas. Como pode Deus privilegiar algumas pessoas, criando-as heterossexuais, e condenar outras a viver uma castidade imposta? Há muitos que criticam o fato de o clero não casar, mas esquecem que todos que aderiram a esse modo de vida o fizeram por livre vontade. Mas as pessoas homossexuais que querem e precisam viver a sua sexualidade, não.
Em relação à anatomia e complementaridade dos corpos, este é um argumento frágil e insustentável. Cada qual sabe o que mais vai lhe satisfazer e complementar, não é quem está de fora quem define isso, até porque a sexualidade envolve outras questões muito mais íntimas e profundas, que dizem respeito aos sentimentos. Não somos máquinas onde uma peça se encaixa na outra para funcionar adequadamente.
Realmente, não é crível que Deus tenha criado alguém para sofrer com o peso da culpa por sentirem-se atraídas por pessoas do mesmo sexo ou por viverem tolhidas na sua sexualidade.
É certo que no livro de Levítico fala que o homem que se deita com outro homem comete uma abominação (Lv 18, 22), mas no mesmo livro diz que se a filha de um sacerdote se prostitui, deve ser queimada (Lv 21, 9), diz também que quando uma mulher tiver relações com um homem, os dois deverão tomar banho, e ficarão impuros até à tarde. (Lv 15, 18), diz ainda que quem comer alguma coisa sacrificada a Deus, terá que ser comida no mesmo dia ou no dia seguinte, se alguém comer no terceiro dia, carregará o peso de sua culpa, porque profanou a santidade de Deus e será eliminado do seu povo (Lv 19, 5-8). Há coisas realmente difíceis de serem compreendidas hoje quando se lê alguns textos do Velho Testamento. E Jesus ainda disse: “Não pensem que eu vim abolir a Lei e os Profetas. Não vim abolir, mas dar-lhes pleno cumprimento.” (Mt 5, 17-20)
Mas quando Jesus fala do pleno cumprimento da lei, ele a aperfeiçoa sempre no sentido do amor, e não no sentido de usar a lei para nos oprimir e condenar, a exemplo de quando ele fala: “Vocês ouviram o que foi dito aos antigos: Não mate! Quem matar será condenado pelo tribunal”. Eu porém, lhes digo: todo aquele que fica com raiva do seu irmão se torna réu perante e o tribunal.” Mas uma vez, Jesus diz: “Vocês ouviram também o que foi dito aos antigos: ´Não jurem falso’ mas ´cumpra os seus juramentos para com o Senhor´. Eu, porém, lhes digo: não jurem de modo algum...Digam apenas ´sim´, quando é ´sim´ e não, quando é não. O que você disser além disso, vem do Maligno.” Assim, nesse último exemplo, Jesus está nos dizendo que devemos ser verdadeiros em toda e qualquer circunstância, de modo que a harmonia possa permear as relações.
Vejamos, ainda, a passagem do evangelho de Lucas, sobre a mulher adúltera (Lc 8, 37): “Chegaram os doutores da Lei e os fariseus trazendo uma mulher, que tinha sido pega cometendo adultério. Elas colocaram a mulher no meio e disseram a Jesus: ‘Mestre, essa mulher foi pega em flagrante cometendo adultério. A Lei de Moisés manda que mulheres desse tipo devem ser apedrejadas. E tu, o que dizes?’ Perguntavam isso para tentá-lo a fim de terem do que o acusar. Jesus, inclinando-se, escrevia com o dedo no chão. Como insistissem em perguntar, ergueu-se e lhes disse: ‘Aquele de vós que estiver sem pecado, atire-lhe a primeira pedra’.  E, inclinando-se de novo, continuou a escrever no chão. Ouvindo isso, eles foram saindo um a um, começando pelos mais velhos. E Jesus ficou sozinho. Ora, a mulher continuava ali no meio. Jesus então se levantou e perguntou: ‘Mulher, onde estão os outros? Ninguém condenou você?’ Ela respondeu: ‘Ninguém, Senhor’. Então Jesus disse: ‘Eu também não a condeno. Pode ir e não peque mais.’ Ora, como o mesmo Jesus que disse que veio para dar pleno cumprimento à Lei, deixou de aplicá-la? A rigor, ele deveria ter concordado com o apedrejamento, pois é como está escrito na lei. Mas, ao contrário, fez todos refletir que aquela lei não poderia ser aplicada. O amor e a misericórdia prevaleceram nesse caso, não a condenação e a morte.
Por outro lado, quando um especialista em leis perguntou a Jesus, procurando prová-lo, o que deveria fazer para receber em herança a vida eterna, Jesus perguntou-lhe: "O que é que está escrito na Lei? Como você lê? Ele então respondeu: ´Ame o Senhor, seu Deus, com todo o seu coração, com toda a sua alma, com toda a sua força e com toda a sua mente; e ao seu próximo como a si mesmo´. Então Jesus lhe disse: Você respondeu certo. Faça isso e viverá.” (Lc 10, 25-28). No evangelho de Mateus, Jesus nos fala que: “Tudo o que vocês desejam que os outros façam a vocês, façam vocês também a eles. Pois nisso consistem a Lei e os Profetas” (Mt 7, 12).
Como se vê, Jesus, mais uma vez aborda o tema do amar ao próximo como a si mesmo, apenas utilizando-se de outras palavras. Das citações acima podemos deduzir que a salvação não passa pela condição de homossexualidade ou não, mas sim pela vivência do amor a Deus e ao próximo, do qual decorrem todas as práticas verdadeiramente cristãs.
E tal raciocínio é corroborado, ainda, pelo que nos diz Jesus mais adiante, no mesmo evangelho: “Quando o Filho do Homem voltar na sua glória e todos os anjos com ele, sentar-se-á no seu trono glorioso. Todas as nações se reunirão diante dele e ele separará uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. Colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua esquerda. Então o Rei dirá aos que estão à direita: - Vinde, benditos de meu Pai, tomai posse do Reino que vos está preparado desde a criação do mundo, porque tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; era peregrino e me acolhestes; nu e me vestistes; enfermo e me visitastes; estava na prisão e viestes a mim. Perguntar-lhe-ão os justos: - Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer, com sede e te demos de beber? Quando foi que te vimos peregrino e te acolhemos, nu e te vestimos? Quando foi que te vimos enfermo ou na prisão e te fomos visitar? Responderá o Rei: - Em verdade eu vos declaro: todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes. Voltar-se-á em seguida para os da sua esquerda e lhes dirá: - Retirai-vos de mim, malditos! Ide para o fogo eterno destinado ao demônio e aos seus anjos. Porque tive fome e não me destes de comer; tive sede e não me destes de beber; era peregrino e não me acolhestes; nu e não me vestistes; enfermo e na prisão e não me visitastes. Também estes lhe perguntarão: - Senhor, quando foi que te vimos com fome, com sede, peregrino, nu, enfermo, ou na prisão e não te socorremos? E ele responderá: - Em verdade eu vos declaro: todas as vezes que deixastes de fazer isso a um destes pequeninos, foi a mim que o deixastes de fazer. E estes irão para o castigo eterno, e os justos, para a vida eterna. (Mt 25, 31-40).
A passagem é grande, mas é importante reproduzi-la na íntegra para, mais uma vez, chegarmos à conclusão de que a homossexualidade é absolutamente indiferente em relação aos planos de salvação que Deus tem para nós. Talvez haja uma certa rigidez na interpretação do tema, até porque se falarmos de (hetero)sexualidade ainda é tabu em nossa sociedade, por mais que tenhamos avançado, o que não dizermos da homossexualidade.
É difícil imaginarmos o sentido de várias regras contidas no Levítico, quando lemos hoje, mas Jesus veio justamente para colocar a Lei sob outra ótica, a ótica do amor. O que poderia restar da lei contida no Levítico poderia ser no sentido de que ninguém deve usar o corpo do outro de forma egoísta, sem que o amor esteja presente na relação, o que reduziria o outro a mero objeto de prazer. Mas isso é válido para qualquer relação, não só a homossexual.
Se as relações homossexuais estáveis públicas nos nossos dias ainda passam pelas barreiras do preconceito, para nós hoje é praticamente impossível imaginarmos como eram vistas e vividas tais relações naquela época, o que talvez para aquele momento fizesse sentido a Lei. Ressalte-se ainda, que em nenhum dos evangelhos Jesus fala a respeito do tema. Apenas mais à frente, na primeira carta aos Coríntios, Paulo vem falar que os “efeminados” não herdarão o Reino de Deus, mas no contexto dos outros que não herdarão o Reino estão adúlteros, depravados, sodomitas etc., e mais adiante ele continua falando sobre imoralidades e prostituição.  Mais uma vez o que se depreende do texto, no contexto em que está inserida a expressão “efeminado”, é que ele está se referindo ao uso do corpo, desprovido de qualquer respeito a si e ao próximo, o que pode ocorrer com qualquer pessoa, homossexual ou não. Do contrário, se formos levar em consideração o entendimento ao pé da letra, o fato de ser homossexual, mesmo sendo casto, já levaria quem o é à condenação, já que “efeminado” estaria como sinônimo de “homossexual”, palavra esta inexistente à época. Então a simples condição de o ser já seria pecado, já que não é escolha da pessoa, e se assim fosse, Deus já estaria criando filhos fadados à condenação, o que não faz o menor sentido.

2 comentários:

  1. Desculpe-me, mas há muita incoerência teológica em seu texto.

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    Respostas
    1. Especifique!
      Incoerência é insistir em um preconceito repugnante.

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